FIDÉLIA

Ela tinha quatro pernas, sua cabeça era quadrada, lisa. No centro, desprendido do comum e insano, existia um orifício largo, repleto de pedaços afiados de lascas do que pareciam ser dentes e de onde emanava um leve fedor de dejetos alimentares, fundidos com a saliva gosmenta e pegajosa.
Além das suas já incompreensíveis quatro pernas, duas abrigavam seus globos oculares cavernosos e piscantes, enquanto das outras restantes uma possuía o orifício anal e a outra seu umbigo, por onde, aparentemente, seria seu órgão reprodutor.
Seu nome era Fidélia.
Um nome incomum para algo tão comum quanto era Fidélia.
Fidélia nasceu, dos mais incomuns seres, cujos possuíam duas pernas e dois braços, daqueles inconvenientemente chamados de humanos. Fidélia nasceu de parto normal, era pequena, leve e matou uma das enfermeiras de parada cardíaca.
Fidélia era objeto mais estudado entre os cientistas, que não descobriam, nem encontravam, respostas racionais plausíveis, para a mais crucial pergunta de todos os tempos:
Teria a mãe copulado com a mesa da cozinha?
Como nada descobriam, mesmo com tanta pesquisa e estudo, os médicos apenas disseram aos pais: “Bem, sinto informar que a sua filha sofre do mal da indalussium corporídios. Uma.. anormalia extremamente rara e que atingiu apenas uma pessoa registrada até o momento.”
Os pais sofreram bizarramente com aquela notícia. Era horrível olhar para ela. Ninguém a aceitava. Alguns, além do asco, iam mais longe, a ofendiam. Outros diziam que era filha do deus do inferno, que traria o apocalipse para a terra, que desviaria os humanos da humanidade.
Coitada da Fidélia.
Ela cresceu. Tornou-se uma anormalia adulta. Os anos se passavam e ela ficava só. Entretanto os humanos mal sabiam que, apesar de todas aquelas pregações horríveis sobre ela, tudo o que Fidélia queria era um amor.
Sim. Ela queria amar.
Por mais ridículo que isso pareça, não é normal amar?
Toda criatura viva não merece amar?
Ora, e quem iria querer uma anormalia como ela?
E pensando nessas coisas que Fidélia dormia, chorando pelo seu orifício anal. Entregando seus sentimentos fracos e latejantes a uma mera poeira de existência.
Mas o destino e o mundo pregam algumas peças incríveis e desajeitadas. Daquelas que você nunca pensa que poderia acontecer, que por mais se tente nunca se compreende.  E foi numa dessas jogadas do destino que certo dia apareceu um jovem, nada muito diferente dos jovens normais entre seus vinte e vinte cinco anos.
Bom...

                                                                                   Ele se apaixonou por Fidélia.



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