O Desconhecido

Ela sentia seu corpo em orgasmo profundo e intenso. Sabia quem ele era e o que iria acontecer com ela depois disso. Mas nada importava, o prazer intenso que ele  proporcionava impedia que raciocinasse.
Deitada no convés do barco, de pernas abertas, ela se deixava levar pelo sexo efervescente. Quando acabou, ainda meio entorpecida, sentiu quando ele a colocou na margem do rio.
Anoitecia na beira do rio, o céu brincava de multicor e brindava sua  margem com os raios do entardecer. A esquerda, sentada, estava uma garota jovem. Seus cabelos longos escorriam por suas costas curvas pela vontade de enxergar o fundo do rio. Ela foi encontrada assim pelos pescadores locais.
A garota foi levada para casa, seus olhos vidrados em êxtase estavam perdidos. E assim ficaram por 7 dias, tempo que levou para sua gravidez repentina criar forma  e ela dar a luz a um garoto e morrer no parto.
Todos da pequena aldeia assustaram-se e não se atreveram a apresentá-la em suas orações, pois eles sabiam que aquela obra era do diabo que vivia nas águas.
Isso ocorria a algum tempo já. Muitas das mulheres haviam sido levadas ao barco do desconhecido e voltaram parindo filhos, cuspindo-os pelo local, depois morriam e suas crianças sumiam, levadas pelo homem sedutor.
Deram-lhe o nome de Devorador.
Certo dia o Devorador levou para seu barco uma das garotas e transou intensamente com ela, depois jogou-a a beira do rio e novamente, 7 dias depois, nasceu uma criança. Entretanto ela não morreu, ao contrário, 7 dias depois estava grávida novamente e 7 dias se passaram até dar a luz.

Foi então que se deu início ao infortúnio da pobre moça.
Ela engravidava seguidamente, sem precisar da fecundação masculina. Eram inúmeros os números de filhos que ela paria, piorava a dor a cada parto e aumentava sua fertilidade a cada gravidez.
Suas crianças nasciam e se desenvolviam rapidamente, iam para a beira do rio e eram levadas pelo Devorador, em seu barco.
As outras mulheres sentiam pena da pobre coitada, mas agradeciam secretamente por aquilo estar acontecendo, pois durante esse período o Devorador nunca mais pegara outra garota.
Então, ao passar dos anos, dela foi constituída uma nação de filhos, e avançada na idade, seu corpo degradado, sobrando da antiga beleza apenas seus cabelos, com a pele enrugada, uma última cria saiu de suas entranhas, ela suspirou e morreu.
O bebê fora deixado as margens do rio para ser levado. Quando o Devorador chegou, colocou-o no barco e remou novamente para o outro lado. A criança mantinha seus olhos fechados, enquanto o homem cantava:
-Desce, desce pelo rio, serpenteia sem parar. Vai remando o barquinho para o outro lado chegar.
Repetindo três vezes até avistar uma pequena onda perdida próxima ao barco, do meio saltaram tentáculos rústicos e verdes alaranjados, grudaram no barco e com força sobrenatural o virou de cabeça para baixo.

A água envolveu todo o barco, abraçando como a um amante, e assim ficou até chegarem do lado oposto ao fundo do rio, onde continha uma passagem tão clara que cegava.
Alguns segundos depois, lá estavam novamente, o barco na posição de antes, mas sobre outro rio, de frente a uma ilha gigante, encoberta por nuvens rosas, árvores de todos os tamanhos e das mais variadas tonalidades.
-Chegamos, criaturinha. – sussurrou o homem. – você é o último, espero ter acertado dessa vez.
Com a mão esquerda segurou o bebê pelos pés e o jogou sobre o ombro, pôs-se a caminhar entre as árvores, em direção a montanha que habitava o centro da ilha.
Ao chegar à entrada da caverna, ele gritou:
-Cheguei!
Por alguns instantes nada se ouviu, mas depois toda a terra começou a chacoalhar, tremer e sussurrar, então, de dentro da caverna saiu uma mulher enormemente gorda, com seus seios sobressaindo da roupa velha, um gigante e outro pela metade, seu ventre era redondo e protuberante, enorme e duro  onde parecia habitar inúmeros bebes.
A boca gigante abriu-se e como estrondo grunhiu:
-Dê-me cá. – estendeu a mão, puxando o bebe até o nariz, cheirando-o ardorosamente. Então, como uma bomba sua voz estourou pela ilha – como pode, seu desastrado? Outra merreca, outra coisa infame, outra vez me decepcionou! Nem mesmo um filho decente consegue me trazer, é assim que quer provar a merda de amor que sente por mim? Seu cavalo retardado!
Ele ia diminuindo a cada palavra estrondada por ela, seus olhos murchavam, sua beleza brochava, sua estatura minguava. Olhava o dedo em riste jogado em sua cara e sentia-se perdido e impotente.
-O que posso eu fazer, querida? Tenho tentado de tudo para trazer-te o bebê perfeito!
-Perfeito? – Berrou ela. Jogando a criança contra a parede da montanha, e observando o grunhido doloroso soltado por ela e depois seu corpo cair em gotas de sangue e carne no chão. – isso? Isso é que você chama de perfeito? Como quer que eu acredite no seu amor se não consegue fabricar uma criança que preste?
Irreverentemente, ela se aprumou agachada no chão, ergueu o vestido puído e fazendo força defecou sobre os restos da criança. O fedor que emanava era tão forte, que as flores e folhas que cresciam ao redor morriam. Ela se levantou e sem ao menos olhar para o chão, disse:
-Coma.
O Boto olhou para ela, sentiu certo medo, nojo, angustia, mas eram pequenos esses sentimentos mediante o desejo que sentia por aquela mulher. A amava tanto que no mesmo momento seus joelhos cederam e ele debruçou-se no chão, e como um porco começou a comer a merda misturada com os restos da criança morta.
Ela sorria prazerosamente olhando aquela cena, sua mão procurou o baixo ventre e enquanto ele comia sofregamente os dejetos, ela se perdia na masturbação alienígena e sobre-humana. Quando chegou ao ápice do seu desejo, com o pé empurrou-o sobre o que restara, virou e entrou na caverna, sussurrando:
-Não preciso mais de você, inútil.
As palavras pesaram sobre ele. Sabia que não poderia discutir. Era isso então? Ele estava dispensado? Não conseguia levantar de entre a porcaria que comera, aninhou-se em posição fetal e deixou suas lágrimas rolarem livremente, enquanto seu coração partido afundava-se em um mar de dor.
Ele adormeceu.
No outro dia uma pontada brusca o fez pular, era um cervo sobre duas patas:
-Ela não foi clara? Está dispensado, homem.
-Mas... mas o que vou fazer sem ela?
-Aqui diz que deve ir para o outro lado do rio, fazer o que quiser fazer. Ela não se importa.
Ele levantou-se, arrasado.
-Diga a ela para me dar mais uma chance!
-Não haverá mais nenhuma. Tem cinco segundo para partir!
Ele começou a caminhar tristemente. Chegou até o rio e banhou-se nas margens. Depois sentou no barco e fracamente cantou:
-Aqui vou eu, levando a semente e buscando a serpente. Reme, reme mais um pouco que o fundo é oco.
Então, das profundezas do rio, surgiu tentáculos azuis e amarelos, abraçaram o barco e o levou para o fundo, devolvendo-o as margens do rio.
Ali permaneceu por alguns dias, pensando no que faria. Ele amava aquele monstro e não poderia perdê-la daquele jeito. Então, resolvido, trocou sua roupa por um terno branco, colocando um chapéu sobre a cabeça, andou até onde havia uma festa e dançou a noite inteira com todas as mulheres do baile.

Quando já de madrugada, puxou uma das garotas até seu barco, onde a seduziu e realizou seus desejos, fingindo ser ela a grotesca mulher do outro lado do rio.
Depois a largou as margens, voltando dali sete dias buscar a criança que com certeza fecundara, mas para sua infelicidade não havia nenhuma, ela não engravidara e tão pouco morrera.
Incessantemente pela eternidade ele tentou, mas em vão.
Fora amaldiçoado pelo Rio.




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