Sobre minhas angustias


    
      As vezes me deparo de frente ao espelho, olhando para um rosto que já não é meu. Sou irreconhecível. Planejei um eu diferente, isso eu lembro. Isso eu posso afirmar. Planejei um eu muito diferente. Imagino quando ocorreu a mudança e percebo que já não tem mais volta. Quem é essa? Eu pergunto. E para minha surpresa o reflexo do não eu me responde, com aquele ar tranquilo mas ameaçador. Não me culpe. Não me culpe pelos seus atos e escolhas. A culpa certamente não é minha.

    Me assusto e olho para os lados, com medo de que alguém me veja e pense que sou louca. Mas você é, continua ele. Você é. Não percebe? E olhe o rumo que isso tomou. Pensei em escrever um pouco sobre minhas angustias, e percebi que não comando o que escrevo. Sou comandada. As vezes estou escrevendo e me perguntam o que é? Sobre o que escreves? E minha resposta sempre perambula pela mesma estrada, não sei, não até terminar.
     Eu acredito muito nisso, entende? Falava ele. Acredito que escrever é um ato solitário. É a pura liberdade, entretanto. Você não escolhe, é escolhido. Por isso, independente do que pretende escrever, você somente saberá o que realmente vai nascer lá no final. É lá que ela grita sua liberdade, a escrita se forma, não totalmente. Não até que alguém leia.
     Não é que ela fique gritando me leia, me leia. Mas ela escolhe, o escolhe. E quando ela faz isso, perdeu, meu amigo, você lê e ela te mostra que é liberta. E o pior, mesmo que esteja consciente de sua escravidão a ela, você continua escrevendo, não importa o quão irritante pareça ser, você se subjuga, como uma amante fiel, pela qual anseia loucamente e mesmo que seus chicotes ardam, você nunca deixa de querê-la, mais e mais.
      A cada dia.
     E então? Como fui chegar aqui? Como essa contraversão do que sou se sobrepõe ao que planejei? Não sonhei, planejei, milhares de vezes, no decorrer da solidão da minha existência, um eu diferente? Quem, ou o que, me transformou nisso?
     Não importa mais. Não mesmo. Porque os laços estão feitos, seu caminho foi marchado, você foi sujeita a você mesma e ao destino. E agora, fraca ou forte, dependendo de como você se enxerga, não pode se mudar. É o que é, aceite e tente viver o resto da sua efêmera e curta vida, com um pouco de felicidade. Afinal, foi você quem criou esta solidão que abrasa sua alma, afoga o coração e transforma estes teus olhos a ponto de você mesma não se reconhecer.
            Levante-se e urja, sujeito.

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